terça-feira, 21 de novembro de 2006

Chile


Um país sul-americano parece estar saindo do rol dos subdesenvolvidos. Visitar o Chile, mesmo que por duas semanas, oferece ao passante a sensação de estar num lugar onde as coisas funcionam, onde não é raro ouvir da população expressões de auto-estima elevadas. Também pudera, a educação está universalizada e a desgraça do analfabetismo erradicada. O principal patrimônio do país são os chilenos educados e cordiais. Mesmo com uma economia que depende basicamente do cobre, da produção de frutas, pescados e vinhos, eles estão conseguindo manter durante vários anos taxas de crescimento elevadas o que torna visíveis a olho nu seus resultados. As estradas chilenas nada devem às dos países europeus, a frota de automóveis é nova. O Metro de Santiago é um show, e já possui uma rede maior que a da cidade de São Paulo. Não se observam favelas e casebres mesmo nos ambientes mais pobres. Os conjuntos habitacionais são mais criativos que os nossos. Vêem-se novas construções de modernos edifícios por todos os lados e sua capital prima pela limpeza e comportamento coletivos exemplares. Convivendo com a poluição atmosférica, Santiago é também, uma cidade arborizada, e suas ruas e avenidas têm calçadas largas. O incrível é que eles conseguem ainda se identificar como pedestres e a gente estranha que os carros parem e aguardem as pessoas atravessarem as ruas.
É para pensar: uma das principais atrações turísticas do Chile são as vivendas construídas por seu poeta maior Pablo Neruda (La Chascona em Santiago, La Sebastiana em Valparaiso e a de Isla Negra). O personagem principal do filme “O Carteiro e o Poeta”, Don Pablo foi escritor, intelectual, político, militante do partido comunista, diplomata e ganhador do Prêmio Nobel de literatura. Ele faleceu de desgosto e infarto, ao ver sua casa de Santiago empastelada, alguns dias após o golpe de estado de 1973, que vitimou seu amigo e companheiro Salvador Allende. Ele mora no coração e na memória de seu povo.
Mas é, na deslumbrante Região dos Lagos Chilenos, sem dúvida uma das mais lindas do globo, que o espírito se enternece. Protegida por seus parques nacionais, a paisagem combina a cor esmeralda das águas dos lagos, com a paisagem das montanhas nevadas e serras cobertas de florestas verdes. Nas estradas de acesso, uma vegetação sem-vergonha, como se fosse praga, decora de amarelo os caminhos. O Monte Osorno, vulcão adormecido, com suas neves eternas, forma um cone que se assemelha a um sorvete de pistache coberto de calda de chocolate branco, que os mais viajados dizem se parecer com o Monte Fuji, no Japão.

“À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava, a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.”
in “O teu riso” Pablo Neruda

sábado, 23 de setembro de 2006

Açores


Pensei que não existisse mais, ou, talvez, não houvesse sequer existido, um lugar onde não se ouvisse um mendigo a pedir esmolas “pelo amor de Deus”. Nem cidades e campos sem a presença de policiais. Sem se escutar discussões ou bate-bocas nas vias públicas. Apenas um espaço ocupado por vivendas de diversos tamanhos, na maioria térreas, sendo exceção ter mais de um piso; casas construídas geminadas ou em terrenos quase sempre sem muros a separá-las. Estradas floridas e campo plantado.
Pois, percorremos durante três dias a ilha de São Miguel, nos Açores, passando por vilas e pequeninas cidades, atravessando um ambiente rural, onde domina a presença das vacas holandesas, em estradas todas elas parecidas com aquelas das serras gaúchas, Campos de Jordão ou Itatiaia, vendo hortênsias novas misturadas às murchas, lírios cor de rosa, flores amarelas em cachos; apreciando as misturas em azul, branco e ocre, tons sobre tons, todos os tons. Vimos plátanos com troncos de cor ferrugem formando alas à beira da estrada, assobradando o asfalto e colorindo as curvas e retas do nosso caminho. Um lugar onde o mar, a vida urbana, a vida rural e as belas paisagens convivem simplesmente.
Visitamos apenas a Ilha de São Miguel, mas o arquipélago dos Açores compõe-se de nove ilhas: São Miguel, Terceira, Santa Maria, Pico, São Jorge, Graciosa, Faial, Corvo e Flores. Seu nome se deve a um tipo de falcão que, segundo dizem os guias turísticos, os primeiros navegadores que aqui aportaram teriam visto. Falam que eram urubus as aves que eles avistaram ao se aproximarem da ilha de Santa Maria em 1427. Hoje em dia, há muitas gaivotas e fragatas sobrevoando e se alimentando de peixes e naturalmente curtindo a vista lá de cima. Há também algumas aves que se assemelham a gaviões, quem sabe não possam ser apelidados de Açores.
A capital da ilha de São Miguel é Porto Delgado. Uma cidade muito parecida com as nossas brasileiras, de arquitetura colonial portuguesa, que nos faz sentir em casa. Parece-se com Paraty, Itanhaém ou Diamantina há cinqüenta anos atrás. Singela mistura de história, simplicidade e acolhimento. Lá tivemos a chance de assistir a uma banda de fado liderada, por um emigrante açoriano que foi viver na Holanda. A Banda Quatro Ventos é composta também por músicos holandeses, que se apresentaram na casa de espetáculos local, o Teatro Micaelense. Fez arrepiar quando tocou o fado “Adeus Macau”, narrando a saída portuguesa da China. A música chora pelos Lusíadas, pela nação de navegadores e pelos inventores da saudade.

segunda-feira, 7 de agosto de 2006

Nas Asas da VARIG - O Retorno

“Da janela vê-se o Corcovado, o Redentor, que lindo!” Ei galera, estamos de volta, no pedaço novamente.
O retorno pela VARIG, nas atuais circunstâncias, teve suas emoções. Acompanhamos atentamente, pela Internet, o noticiário sobre as negociações para recuperação da empresa, os dramas vividos pelos empregados e pelos passageiros, entre os quais nós. Notícias desencontradas e falta de informação causaram suspense. Telefonamos, enviamos e recebemos e-mails, tentamos alternativas em outras companhias (que obviamente começaram a aproveitar-se da situação, pedindo preços elevados). Alguns números de telefone não atendiam, outros deixaram-nos a ouvir gravações com mensagens de espera. Porém a Varig-logo nos reservava uma agradável surpresa. Soubemos que todas as operações na Europa teriam como base o escritório situado em Frankfurt. Por uma dessas felizes coincidências estávamos em Koblenz, cidade alemã localizada na confluência dos rios Mosele e Reno, que dista cerca de 100 km. de Frankfurt. Resolvemos então, ir lá para checar à situação de perto, pois a estávamos conhecendo apenas por notícias e fofocas. Ficamos satisfeitos com o que vimos. A empresa está em situação difícil, mas lidando com os problemas de maneira profissional. Estão colocando vôos extras e se encarregando da hospedagem dos passageiros que não conseguem lugar. Enfim, organizaram a nossa volta comprando para nós o trecho Paris-Frankfurt pela Lufthansa e reservando assentos no vôo da Varig Frankfurt-Rio de Janeiro. Tudo dentro dos conformes. Nenhuma mala foi extraviada mesmo com duas conexões. Incrível, principalmente se levarmos em conta a zona em que se transformaram os aeroportos de toda à parte, sendo que o de Paris concorre a prêmio no quesito zorra total.
Na volta o piloto da VARIG resolveu oferecer um regalo aos passageiros, programou a rota de modo a dar um sobrevôo sobre Paris. Era meia-noite e vinte minutos, a noite estava limpa e pudemos contemplar a cidade luz mais uma vez, agora de cima: observar a torre Eifel iluminada, a Ilha da Cité e o traçado iluminado de seus Boulevards e dizer Au Revoir Paris.

segunda-feira, 17 de julho de 2006

Nas asas da VARIG

A Varig já foi grande no nosso imaginário, dizíamos que ela tinha o melhor serviço de bordo do mundo, em um tempo romântico, quando viagens de avião não eram coisas corriqueiras. As famílias iam se despedir daqueles que tinham a coragem de viajar de avião ou então recebe-los com festa, quando voltavam de longas estadias fora de casa. Subir as escadas que levavam ao aparelho, parar em seu cimo, voltar-se para um adeus de lenço branco na mão, fazia parte do ritual das personalidades fotografadas para as revistas. Era um acontecimento que herdara as emoções das viagens de navios a vapor que levavam as famílias aos portos para grandes despedidas. Quantas lágrimas, juras de cartas nem sempre cumpridas.
A cada nova rota inaugurada pela Varig eram criados jingles e filmetes para a televisão, todos uma atração, que terminavam invariavelmente com o famoso Varig, Varig, Varig…
Num dos de maior sucesso, na cadência do fado se cantarolava: “Seu Cabral vinha navegando, quando alguém logo foi gritando: terra à vista. Foi descoberto o Brasil. E a turma toda falava, bem-vindo seu Cabral. Mas, Cabral sentiu no peito, uma saudade sem jeito. Vou voltar para Portugal, quero ir pela Varig. Varig, Varig, Varig…”
Porém os tempos são outros e quando se possui um bilhete de volta para casa de uma companhia aérea que passa por um processo de “recuperação judicial”, a gente, naturalmente, passa a prestar mais atenção ao noticiário sobre esta empresa. Quais os próximos vôos que serão cancelados? Os resultados das assembléias de trabalhadores e se vai haver leilão, ou não. Se haverá combustível para a próxima semana; enfim, coisas do gênero.
Na avenida Champs Elisée, 38, primeiro andar, fica a sede da Varig em Paris. Noutros tempos os refugiados políticos, ansiosos por notícias do Brasil, acorriam à sede da Varig para ler jornais e revistas amanhecidos. Na época, ainda não havia Internet e as ligações telefônicas poderiam estar censuradas. Hoje, não há mais jornais brasileiros para ler, porque os vôos que fazem a linha Rio-Paris foram cancelados até o dia 18 de julho. O ambiente na sala é de uma calma silenciosa. Poucas pessoas aguardando e apenas duas zelosas funcionárias realizando o atendimento e explicando que por enquanto nenhum passageiro deixou de viajar para o Brasil. Tão simples quanto o seguinte: - É bom o Sr. chegar mais ou menos ao meio dia (o horário do vôo previsto para as 22:30h.) porque os passageiros de Paris, estão sendo transferidos para Frankfurt ou Londres e dependem de lugares nos vôos da Lufthansa para a Alemanha e de uma outra empresa regional para a Inglaterra e também de lugares nos vôos para o Brasil. “Eles” ainda não cancelaram os horários após o dia 18, então tudo pode acontecer. Nós estamos com poucas informações e elas mudam a todo momento é bom ligar para o call center, mas lembre-se que depois da 18h. não atendem mais. Mas não é, que estou com uma saudade enorme da Varig,Varig, Varig…

quarta-feira, 12 de julho de 2006

Grande Zizou


O monumental estádio olímpico, construído pelo III Reich em 1934/36, esperava colorir-se de vermelho, amarelo e preto junto com o verde e amarelo. Alemanha e Brasil : a final dos sonhos dos cartolas da FIFA. Tudo arranjado para o encontro futebolístico do século XXI, com os dois melhores times do mundo. Porém, de repente, pintou a possibilidade do jogo final ser entre a Alemanha e a Inglaterra, ou ainda pior: entre a Alemanha e a França, com direito a Marselhesa e tudo mais. Ia ser meio esquisito, poderia sugerir lembranças inconvenientes.
A sabedoria e o capricho dos deuses da bola quis que o Olimpianstadium se vestisse todo de azul, não aquele da América do Sul, mas o da Azurra contra os Les Bleus. Pode um time com Buffon e Grosso e outro com Barthez e Zizou? Pode. Que ganhe o melhor, ou que se dane (será que eu ouvi Zidane?).
Em Paris, a Avenue Champs Elisée acolhia uma imensidão de gente, muitos com os rostos pintados com azul, branco e vermelho. Havia outros jovens enrolados em bandeiras da Argélia. Poucos italianos com vontade de mostrar a cara. Muitos policiais. A festa toda preparada para a comemoração da vitória da França. Haveria uma festa de gala para a despedida da melhor geração de jogadores que a França já produziu. Como convem, o “chichi”, como é chamado o Jacques Chirac estava no estádio ao lado de madame Merkel, a chanceler alemã. Tudo preparado para o sucesso de mais um impecável evento promovido pela FIFA.
Zinedine Zidane, o craque da copa, o melhor jogador francês de todos os tempos, já estava de saco cheio. Era o segundo tempo da prorrogação do jogo decisivo, em que ele tinha feito um gol de penalty fajuto (de “arbitragem generosa”, como dizem os franceses, ou cavados, como dizemos nós). Afinal ele já tinha ganhado do Brasil, dando um show, com direito a chapéu encima do Ronaldo fenômeno e em não sei mais em quem. O jogo com a Itália estava duro de assistir, quanto mais de jogar, e pelo jeito a copa ia ser decidida novamente nos penalties, um saco. Aí vem aquele cara falar mal da irmã. Não deu outra, como em toda sua vida, ele nunca foi cara de deixar barato, ele partiu pra cima. A idéia era arrebentar o nariz do sem-vergonha que faltou ao respeito, fazer sangrar, mas o cara deu sorte e fez a cena. O babaca não encarou, preferiu se jogar no chão e chamar o juiz.
Na televisão francesa, o Galvão Bueno daqui dizia: Não Zizou, hoje não Zizou, é o dia da sua despedida, você ainda pode ser campeão, hoje não Zizou, daqui a pouco vai ter a cobrança de penalties. Hoje não Zizou…
E sem ele a França perdeu. No dia seguinte, o l’Equipe, o jornal de esportes da França, que havia nos dias anteriores faturado encima dele, não estampava mais sua foto em primeira página e em seu editorial já o chamava de Geni. Como na ópera do malandro: “joga bosta na Geni, ela é feita pra apanhar, ela é feita pra cuspir”. Como alguém, que tinha recebido tanto carinho da torcida, podia agir daquela maneira? Que mau exemplo para as crianças do mundo inteiro, que estavam assistindo àquele jogo. Como explicar para seus 4 filhos, tal atitude? Que traição aos companheiros em momento tão importante (sic).
Com quais companheiros alinhar Zidane? Com Puskas? Didi? Garrincha? Pelé? Euzébio? Gérson? Beckenbauer? Maradona? Ronaldo????? Com Quem?

domingo, 2 de julho de 2006

Paris futebol visto daqui

O som das buzinas, tão familiar nos dias das grandes vitórias: os carros passando com bandeiras, uma verdadeira procissão de jovens, os gritos, fizeram-nos pensar que o resultado do jogo não era o que nós havíamos acompanhado pela televisão. Afinal quem havia ganhado?
Nós tínhamos assistido a uma exibição de Zidane e o nosso time em dia de pelada, chutando a bola para qualquer lado, pior que na copa de 1998. Porque tanto barulho se o Brasil tinha perdido?
Pois aí caiu a ficha, nós estamos aqui na terra deles.
Parece que os franceses já ganharam a copa. Na verdade, para eles é como reconhecer a firma da vitória que tiverem sobre nós, na copa da França. Agora, em campo neutro, essa geração de “velhos” mostrou que podia ganhar do Brasil. Foi como uma lavagem de alma para eles. Sentíamos durante os momentos que antecediam o jogo que eles tinham certeza que venceriam o Brasil, que precisavam ganhar do Brasil, mostrar que a outra vitória, a de 98, não tinha sido um acidente arranjado. Era a confirmação de que eles haviam sido campeões do mundo. O povo foi às ruas celebrar o feito, eles ganharam dos galáticos, dos atuais campeões do mundo, de uma equipe que parecia invencível.
Eles não perdem por esperar, o que eles não se deram conta é que um outro brasileiro segue ainda campeão: seu nome é Felipão, o cara ainda está invicto, como técnico, em copas do mundo. À tarde, em uma partida dramática os portugueses passaram por cima do “English team” e também foram para as semi-finais. Vamos a ver, ó pá! A vingança vem a cavalo, e é dos pampas, tchê.
Não desejamos comentar a mediocridade do nosso time.
Mas uma coisa é certa, os franceses não vão ter a mesma moleza contra o time do Felipão. Eles têm time para vencer, mas parece que o principal objetivo deles já foi atingido, porque o barulho que fazem é infernal. Não sei se vamos conseguir dormir.

domingo, 25 de junho de 2006

Paris copa do mundo

Em época de copa do mundo, como em todo lugar, a seleção nacional de futebol mobiliza a paixão dos torcedores. “Allez les bleus”, o grito de guerra dos torcedores franceses, era o que se ouvia depois da “brilhante” vitória sobre a seleção de Togo. Eles também acham que vão ser campeões. Fomos assistir a partida em um café perto de casa, afinal não poderíamos deixar passar esta oportunidade de vê-los sofrer, precisavam ganhar para não serem eliminados. E como sofreram, o fanatismo contido dos seus torcedores faz com que batam palmas diante da televisão quando ocorre alguma jogada de suspense. Mas após vencerem já pensam em enfrentar o Brasil. Os franceses, como todos os torcedores, ficam chiando o tempo todo, e a comparação com a nossa seleção é inevitavel, ocorre a todo momento, tanto na telinha quanto nas observações da platéia. Se eles forem em frente, acho que o clima futebolístico na cidade deve esquentar um pouco mais. Até o momento, a presença da copa está nos jornais, nos bares e nas publicidades, onde a figuras centrais são: o Ronaldinho gaúcho e Zidane herói nacional para eles e de triste lembrança para nós. O pessoal daqui gostaria de ter o Ronaldo fenômeno, mesmo gordo, em sua equipe; o cara é recordista de gols mas a nossa turma ainda acha que ele é grosso. Enfim, coisas da paixão pelo futebol. E os argentinos hein? Precisaram de um gol contra e de um gol espírita para vencer os mexicanos. Não boto muita fé neles, embora eu espere que eles estejam guardando tudo para o jogo contra a Alemanha que está com a bola toda. Por aqui é comum ver o pessoal com a camisa verde e amarela, mas estão esperando mais da nossa seleção, querem show e muitos gols, como nós aliás. Se não golear é porque a equipe jogou mal e não houve empenho da turma. É impressionante como o conhecimento do Brasil no exterior se restringe ao futebol, o que é uma perda para eles. Afinal o futebol é apenas um detalhe, mas que detalhe! Dizem até que é no labirinto dos detalhes que moram os sonhos dos humanos habitados por anjos e demônios e que ao dormir eles se movimentam e ao acordar eles se escondem.

Paris Giverny e Marmotan


Nestes dias em Paris estamos morando num apartamento conjugado, que os franceses chamam de ‘studio’, que se situa no 32 bis, Avenue René Coty, no 14eme arrondissent, próximo a cidade universitária, para chegarmos nela basta atrevassar o Parc Montsouris. Salvo o perfume deixado no hall de entrada por dois cachorros do vizinho de baixo, que mais parecem bezerros, o apartamento é agradável, tem uma varanda, e podemos até ensaiar pratos da culinária francesa, e também lógico beber vinhos locais que compramos no supermercado perto daqui. O bairro é fora do centro o que permite um dia a dia comum.
Às vezes, de vez em sempre, saímos para diversos programas. Um dia desses, pela manhã, pegamos o ônibus 28, que passa perto, na Av. Gen. Leclerc, e fomos até a Gare de Saint Lazare, donde tomamos um trem para a cidade de Vernon e de lá um ônibus para Giverny, pequena vila de cerca de 600 habitantes, tudo para conhecer a casa de Claude Monet e seu famoso jardim. O pintor comprou a casa quando já tinha 50 anos de idade e após três anos adquiriu um grande terreno ao lado para completar seu quintal e instalar seu jardim das águas, pelo visto, uma de suas paixões. Ao contrário da época em que vivia, ele decidiu construir um jardim onde as flores se misturam: lilases, rosas de diferentes tipos e cores, amor-perfeito, tulipas, flores do campo e muitas outras mais. Monet quis construir o seu jardim japonês, com um pequeno riacho e ponte, aonde se forma um espelho d’água, cheio de plantas, entre as quais algumas que se parecem com pequenas vitórias-régias. Neste ambiente, ele pintou grande parte de sua vastíssima obra. Hoje há uma fundação que procura manter este jardim, o máximo possível, conforme o seu autor idealizou e realizou. É como se estivéssemos a sonhar, mirando o jardim, e de repente, sentíssemo-nos a passear pelos quadros pintados por Monet. É como viajar em um museu vivo. Lá se encontram pessoas que pela fotografia, pelo desenho e até pela pintura, parecem querer continuar o trabalho do grande artista. Mas a emoção não foi deixada lá; no dia seguinte fomos ao Museu Marmotan que reúne muitas de suas obras pintadas em Giverny. É demais, o cara entre 50 e 85 anos de idade produziu beleza plástica atrás de beleza com os diversos olhares que dirigiu ao seu jardim. Este museu em Paris, relativamente pouco visitado, recebeu, por doação de seu filho Michel Monet, suas obras e sua coleção particular. O Museu Marmotan se origina de uma família de abastados colecionadores e abriga também o quadro de Monet: “Impression soleil levant” que deu origem ao movimento impressionista a ao termo “impressionismo”, após a crítica irônica da mídia especializada à época em que foi pintado. Pode-se, neste museu, com toda tranqüilidade, ficar a contemplar suas obras e viajar por suas cores e formas.

Europa Euro

A vida dos que viajam pelos países da Europa ficou muito facilitada com a criação de uma moeda comum: o euro. Não há mais aquela coisa de escudos, pesetas, marcos, francos, liras, e várias outras moedas. Anteriormente, os viajantes precisavam fazer um monte de contas para calcular suas despesas, tinham que converter os preços para o dólar americano para ter uma idéia de quanto estavam gastando, sem se falar do levantamento que tinham que fazer das cotações do dólar na moeda local que variava de esquina para esquina. A sensação era a de que sempre estavam sendo enganados. Porém, embora o euro já tenha quase seis anos, as contas e notas fiscais aparecem com dois valores: um em euro e outro na moeda local, calculada a conversão com base ao valor da data de adoção do euro (2000). Parece esquisito mas ainda hoje as pessoas fazem as contas como se a moeda anterior existisse e a opinião de grande parte delas é que tudo passou a ficar muito mais caro após a criação de uma moeda comum. Mesmo que a tendência das pessoas seja a de lembrar mais dos preços do que dos seus rendimentos na moeda antiga, seus comentários indicam que alguma razão eles devem ter, principalmente naqueles países que tinham preços relativamente mais baixos, como Portugal e Espanha. Na França também as pessoas chiam. Quando alinharam os preços pelos países de moeda mais forte, a conseqüência foi, em alguns países, de os preços de fato subirem; nestes as rendas também eram e são mais baixas; assim, a turma logo percebeu que a vida não ia ser fácil com a nova moeda, mesmo com todos os investimentos que foram realizados. Ao se viajar atualmente, observa-se pouca diferença de preços entre os países, a exceção da Alemanha, aonde os preços de alimentação são bem mais baixos do que em Portugal, França ou Espanha. Hoje, o euro é uma moeda mais forte que o dólar e não se nota mais aquela dominância das verdinhas.

terça-feira, 13 de junho de 2006

Paris Turista Sofre


Como turista sofre! Fala-se que Paris e arredores somam hoje aproximadamente dez milhões de habitantes. Os guias turísticos informam que cerca de setenta milhões de pessoas passam pela cidade durante o ano, donde se conclui que na alta estação há dias que a cidade dobra seu contingente humano.
Como turista sofre! Se um visitante recém chegado à cidade resolver subir a torre Eiffel, pode-se preparar para encarar uma fila de uma hora para pegar o plano inclinado para subir ao segundo nível da torre e lá mais uns cinqüenta minutos para ir de elevador até o topo. Lá de cima, com dia claro, tem-se uma visão completa de toda Paris, claro, acompanhados das torcidas de vários países, que entre suspiros e fotos expressam todas suas emoções.
Ah! Como é agradável sentar-se num café e apreciar o movimento! Ir ao Marais ou ao Quartier Latin, espaço contado em prosa e versos, freqüentado por Sartre, Simone de Beauvoir e tantos intelectuais e artistas. Apenas um detalhe! Haja bares e cafés, com seus toldos vermelhos, cadeiras de palhinha, mesinhas redondas com tampo de mármore, para receber as pessoas que tiveram a mesma idéia. Por que não ir então ao Museu de Orangerie para ver as obras de pintores impressionistas? Que surpresa, outra filinha de uma hora de espera ao ar livre.
A impressão que se tem é que Paris está ultrapassando seus limites e capacidades. Em toda cidade o estacionamento de automóveis nas ruas é pago, já há muitos anos, e como os prédios não possuem garagens e não permitem o estacionamento encima das calçadas como em certas cidades mais descontraídas, observa-se um paradoxo: como os carros estacionam se jamais encontram vagas para estacionar?
A cidade possui uma invejável rede de Metrô articulada a um eficiente sistema de linhas de ônibus, mas não é fácil encontrar lugares para sentar e durante o dia, como o congestionamento permanente, leva-se horas dentro de ônibus em geral lotados. Parece que a cidade está chegando perto do seu limite.
Cresce o número de novos edifícios comerciais altos e os edifícios residenciais novos, embora respeitem o gabarito de seis ou sete andares, dão um jeito de por mais um ou dois andares mediante a redução do pé direito, coisa de arquiteto contemporâneo.
Conclusão: avisem todo mundo que não é mais para visitar Paris. Ta?

Paris Atual


A que um dia já foi chamada de cidade luz, considerada um dos centros do mundo, não sabemos se ainda é. De alguma maneira encarna as contradições dos dias atuais. Os franceses disseram não, pelo voto, à ratificação da constituição européia e disseram não, através de grandes confusões e manifestações de rua, à chamada lei do primeiro emprego, ambos por considerarem uma ameaça ao seu modo de vida. Num certo sentido o que está em questão para eles é o ‘european way of life’ com sua ênfase na proteção social e o ‘american way of life’ baseado na competição e na chamada economia de mercado. Haverá eleições gerais no ano próximo e os partidos políticos estão concentrados no debate das questões do emprego, do futuro dos jovens, no custeio da previdência social e também na questão da segurança pública. Ainda continua a ocorrer nas periferias alguns embates entre jovens, às vezes encapuzados, com as autoridades, em verdadeiras batalhas campais, enquanto os políticos discutem leis mais liberalizantes ou redução da jornada de trabalho para 35 horas semanais e aumento do salário mínimo. O centro das questões ideológicas não está mais entre socialização dos meios de produção e a livre iniciativa, mas no emprego e na disputa direta pelo resultado da produção e pela maior ou menor exploração da força do trabalho humano.
Paris é hoje uma cidade além de cosmopolita também mestiça, observa-se a convivência multirracial e a miscigenação em todos os cantos. A população de negros e mulatos é grande e por vezes pensamos que estamos no Rio de Janeiro. Ao contrário de outras cidades européias há uma aparente convivência civilizada entre as populações de diversas origens étnicas, religiosas e raciais. Parece-nos, à primeira vista, uma sociedade em busca de uma nova identidade, agitada e estressada o tempo todo, com Metrô e ônibus cheios, as pessoas correndo de um lado para outro, com aquela agitação das grandes metrópoles. Há também inúmeros visitantes presentes na cidade  em busca de seu glamour e de sua intensa atividade artística e cultural.
Sem dúvida continua a ser uma cidade cheia de vida, porém seu aspecto denuncia, não sei bem dizer, se um ar de dificuldades ou de decadência. A labuta pela manutenção de uma das mais incríveis cidades já construídas pela humanidade contrasta com um certo pessimismo dos franceses que sentem as conseqüências da diminuição do papel que sua sociedade e cultura já tiveram no mundo. Todos criticam que a adoção do euro tornou o custo de vida muito alto e o sentimento de nostalgia, expressa uma sensação de perda, de um tempo que as coisas eram melhores. Será?

sexta-feira, 26 de maio de 2006

Colônia

Quando se viaja de Berlim para Colônia, pelas rodovias alemãs, pode-se observar um paradoxo: em vários lugares a exploração da energia dos ventos - eólica – com seus inúmeros cata-ventos, concorre na paisagem com grandes usinas movidas a energia atômica, ao que se sabe, principal fonte de suprimento de energia elétrica em boa parte do continente europeu e asiático. O politicamente correto da utilização de fontes alternativas coabita com a polêmica ameaçadora da energia nuclear.
A famosa catedral de Colônia é realmente de fazer cair o queixo. Sua construção foi iniciada no século XIII mas somente concluída em 1880. Dá vontade de voltar a ela várias vezes para contemplar sua imensidão e as suas magníficas esculturas, tapeçarias, pinturas e vitrais. Quando se olha para suas torres, de tão altas elas parecem se arredondar, é inevitável lembrar-se da obra de Gaudi em Barcelona. Terá o mestre se inspirado na catedral de Colônia? 
Porém Colônia é mais do que sua Catedral, cortada pelo rio Reno, tem muito charme e beleza. Como uma das cidades mais antigas da Alemanha ela mistura o antigo e o novo, com suas igrejas românicas e torres medievais que resistiram ao tempo. A cidade soma 1 milhão de habitantes e situa-se na Renânia do Norte-Vestfália, numa região industrial do país, numa espécie de ABC.
A convivência de executivas com seus terninhos básicos e executivos de gravata com turistas de tênis, jeans e mochilas lhe confere um toque original. As diárias nos hotéis da cidade são mais baratas ao final de semana indicando esta característica que se observa ao andar por suas ruas e sentar para tomar cerveja em seus bares. Por sinal, por estas bandas alemãs, como se bebe cerveja e se come carne de porco, batata, chucrute, e, nesta época do ano, aspargos frescos preparados de todas as maneiras.
Assim encerramos esta etapa da viagem iniciada na formosa Lisboa rumo à Paris, via Praga. Na ida de Colônia para Paris experimentamos a força dos ventos nas estradas, de arrepiar motoristas calejados, uma emoção a mais, neste périplo de 50 dias.

Berlim 2

É emocionante chegar a uma cidade com a história recente que ela tem. Há menos de 20 anos estava divida por um muro, construído a partir de 1961 e que foi derrubado em 1989.  De um lado ficaram os russos (a Berlim oriental) e do outro os aliados (a Berlim ocidental) que a dividiram em três setores: inglês, americano e francês  constituindo um território encravado, como se fosse uma ilha, na chamada Alemanha Oriental. Como terá sido a vida de seus habitantes neste período de mais de meio século, desde o entusiasmo com a ascensão do nazismo até a decepção da derrota, as incontáveis vítimas e a sua quase total destruição?
Hoje, Berlim surpreende quem chega para visitá-la. A sua população é de aproximadamente quatro milhões, mas como é uma cidade espalhada, com vários “centros”, e um padrão de construção de prédios baixos e ruas largas, tudo parece muito espaçoso e sem confusão aparente, com uma notável rede de transportes, inúmeras praças e parques, onde nesta época que o Sol já começa a se firmar, vê-se pessoas muito a vontade se esparramando pelos gramados, algumas delas nuas e branquinhas.
A Berlim de hoje é uma cidade cosmopolita, com grande movimentação cultural e presença de estudantes de todas as partes.
Tivemos a sorte de estarmos na companhia de dois estudantes de arquitetura: a Martinha e seu namorado Thomas, ela brasileira e ele alemão, um privilégio, pois recebe-se, além de muitas informações e dicas, o sentimento de quem vive a cidade em seu dia a dia.
Berlim, para quem gosta das grandes cidades, é um menu completo. Desde coisas estranhas, como o fato de estarem demolindo a antiga sede do governo da Alemanha Oriental (comunista), segundo se argumenta, por razões estéticas não observáveis a olho nu, até coisas formidáveis como a exposição fotográfica permanente no lindo prédio do Parlamento (Reichstag), que apresenta uma resenha da vida política do país, desde sua construção  no século XIX. O prédio tem em sua parte superior uma abobada de vidro, de livre visitação, que através de espelhos permite que se observe de vários ângulos os deputados trabalhando. Dizem eles que objetiva dar transparência à casa do povo. Pode ser. Sei não.
Berlim é hoje uma cidade onde se vê guindastes por todos os lados, obras novas, de reconstrução e restauro. 
Berlim é uma cidade que cativa.

Berlim


É notável o número de crianças pequenas, passeando com seus pais em super-carrinhos, crianças lindas que nos faziam o tempo todo lembrar da Luisinha. Ah! Quanta saudade da pequena e dos grandes também. Nas cidades em que visitamos, pelo jeito, eles estão levando à sério a recuperação da taxa de natalidade. Não pensem que eles esqueceram dos cachorros, eles aqui freqüentam restaurantes, supermercados e passeiam de metrô e ônibus. Aqui afinal, cachorro também é gente, como disse um certo ministro de esquecível memória.
A presença de estrangeiros, particularmente dos turcos que imigraram em grande número para o esforço de reconstrução da Alemanha, é dominante em vários ramos de comércio. Na Alemanha, como em alguns outros países, o direito de nacionalidade é obtido pelo sangue, jus sanguinis, e eles têm agora que resolver a questão dos filhos e netos desta galera que já nasceu no país, se sente do país, fala a língua do país, mas tem seus direitos políticos limitados, mesmo que os benefícios sociais sejam universalizados. Questão semelhante está tendo que ser tratada por outros países da Europa.
Quando houve a derrubada do muro de Berlim, eles quase iam se esquecendo que era importante manter uma parte, para a preservação da memória histórica da cidade. Há ainda cerca de 1 km, que é como uma galeria a céu aberto, todo pintado, ao estilo dos grafites, com manifestações diversas de apelo a paz e a liberdade . A percepção que se tem é que eles não querem se lembrar daquele muro pois não há muito material disponível que indique o seu traçado e o que provocou na vida dos habitantes da cidade.
A bicicleta é um meio de transporte largamente utilizado e a cidade está preparada para os ciclistas, há ciclovias demarcadas por toda a cidade, os vagões de metrô e mesmo os ônibus prevêem seu uso. Vêem-se mais bicicletas que motos circulando pelas ruas. Aliás, o mesmo, observamos na maior parte das cidades que visitamos.
Em toda a Alemanha pode-se ver bandeiras do Brasil e cartazes com fotos ou caricaturas do Ronaldinho Gaúcho e é muito comum vermos europeus com a camiseta verde e amarela. O futebol é sem dúvida a principal marca de promoção do nosso país por estas bandas e neste ano de copa do mundo que, ainda por cima, nos consideram favoritos, por toda parte topa-se com as cores nacionais.
A partida final da Copa está prevista para o estádio olímpico de Berlim, que foi construído para a olimpíada de 1936. É um estádio imponente de arquitetura austera, bem ao estilo do que se construiu à época do nazismo. Torcemos que os nossos Ronaldinhos estejam lá, e que o nosso favoritismo não de azar. Acho que seria de arrepiar uma final contra os donos da casa.

Dresden

Dresden

Saímos de Praga, capital da Boêmia, e chegamos a Dresden, na região da Saxônia, que até pouco tempo atrás fazia parte da chamada Alemanha Oriental. A cidade foi uma das mais atingidas pelos bombardeios aliados ao final da Segunda Grande Guerra Mundial. Ainda hoje as obras de restauração e reconstrução estão por todo lugar. Os habitantes mais velhos, em sua maioria, são pessoas rechonchudas e meio secas no tratamento, normalmente não falam uma palavra em qualquer outra língua, muito menos inglês. Também não é para menos, estas cidades alemãs passaram por várias duras durante mais de um século, vivendo muitas necessidades, ilusões e decepções. A população mais jovem percebe-se que já está em outra, olhando mais para o futuro, mais inserida no mundo globalizado e se dedicando ao trabalho. Há inclusive uma nova instalação – vertical - da Wolkswagen em um edifício cujas paredes são de vidro, localizada próxima ao centro, que surpreende por sua aparência não convencional. Uma curiosidade: em Dresden foi inventado o leite condensado e até hoje há a leiteria, toda decorada em azulejos, onde funciona um café e restaurante que serve, obviamente, leite condensado e outros drinks, como por exemplo cerveja.
Dresden tem em sua área central histórica várias construções de respeito, algumas totalmente reconstruídas, como a Igreja Frauenkirche, que depois de pegar fogo implodiu e foi reconstruída seguindo os detalhes do projeto inicial. O maior destaque é o palácio Albertinum que hoje abriga um museu que reúne uma das melhores coleções de pintura dos séculos XVI ao XIX, que se constitui em importante referência cultural e que atrai muita gente para visitá-la, principalmente da própria Alemanha

Cortada pelo rio Elba, a cidade tem um aspecto singelo e bonito. Quer se passeie de barco ou a pé, vive-se num ambiente onde a nossa mente viaja se perguntando: como que lugares tão atormentados por períodos históricos tão conturbados, apresentam tal capacidade de reconstrução e de criação de uma nova ambiência humana de trabalho e convivência?