quarta-feira, 19 de abril de 2006

Arles


Quando se chega ao Sul da França, mais precisamente à região da Camargue, a paisagem já começa a sugerir que coisas diferentes vêm pela frente. E não dá outra coisa. A nossa motivação para fazer uma parada na cidade de Arles era a de fazer um curso de culinária, que uma colega tinha dado a dica. Na verdade era mais do que isso, era a de se hospedar numa pousada de um casal: ele francês nascido na região e ela americana de perto de Nova Iorque. O curso consistia em uma preparação em conjunto de um jantar completo. Desde sair de manhã às compras dos ingredientes e temperos na conhecida feira de Arles, até à tarde, a partir de cinco horas, reunir o grupo (um casal de americanos, nós e mais o casal anfitrião dono da pousada) na cozinha para prepararmos a refeição da noite. Começamos a nossa “festa de Babette” particular. O menu planejado pelo professor consistia de uma entrada de aspargos verdes, Asperges au Sauce Maltaise, cozidos em feixes amarrados com barbante, regados com um molho de maionese feito com mostarda e suco de laranja vermelha. Um primeiro prato que era uma espécie de torta de berinjela, Papeton d’Aubergine, regada com um molho de tomate com alcaparras e suco de limão siciliano ralado com alho. Um segundo prato: camarões grelhados em espetos, entremeados de meias-rodelas de tangerina, temperados com suco de limão. O prato principal eram lulas, Les Tautènes Farcis à la Sauce Tomate, recheadas com tomate, peixe (tamboril) e uma pasta de salsinha com arroz. Uma vez cobertas por molho de tomate foram ao forno. Tudo com muitas herbes de provence. A sobremesa foi uma torta Mille Feuille/Napoleon recheada de creme e pedaços de morango e com respingos de chocolate na cobertura. Ia me esquecendo, antes do jantar, distraidamente, um aperitivo: vinho de Cassis, acompanhado de ostras frescas. Os detalhes todos da preparação dos pratos eram explicados pelo chef e feitos por nós, desde a limpeza de todos os ingredientes, seus cortes e misturas. Foram três horas de preparação que passaram num tris. O jantar, regado à três tipos de vinho, foi como um sonho de uma noite de primavera.
Arles é uma cidade que vem desde a época romana, não é murada, o que lhe garante uma vida normal, não é uma cidade museu, é cheia de vida, suas ruas são estreitas e mesmo assim os carros circulam por elas, como era de se esperar, às vezes o trânsito para e nem por isso as pessoas buzinam, parece que elas já aceitam normalmente, que esperar é preciso. Uma curiosidade da cidade é que nela ainda há corrida de touros, realizada justamente na arena romana que hoje tem arquibancadas “discretamente acrescentadas” para abrigar mais público ainda. Óbvio que touradas marcadas para a semana-santa não deixariam de ser recebidas também com protestos de ONGs de defesa dos animais. Foi em Arles que Van Gogh passou dois anos de sua vida, onde esteve internado por loucura, cortou sua orelha e onde pintou alguns de seus quadros mais conhecidos. A cidade até hoje reverencia o pintor. Andar pelas ruelas de Arles é como passear pelo tempo, uma cidade cheia de história que preserva suas casas e construções antigas. O passado da presença romana é o ar que se respira o tempo todo, num ambiente francês interiorano típico que procura valorizar o que lhe é próprio e receber bem a todos que lá chegam. 

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